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FC Porto

Um que o braço tira, outro braço devolverá

No Jamor, casa emprestada do Belenenses enquanto SAD e clube não são um só, o FC Porto ganhou (2-3) com um penálti nos descontos, o segundo provocado por bolas que bateram em braços e que ajudaram a distinguir a equipa que teve mais bola e mais saídas em posse, desde trás, da que mais sofreu para arranjar soluções para os problemas com que se foi deparando

Diogo Pombo

PATRICIA DE MELO MOREIRA

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Estava Diogo Leite a devolver a perna esquerda à relva, aterrando o gesto com o seu quê de elegância, e porque não graciosidade, um movimento de quem acabou de cortar a bola, fazendo-a descolar para a frente, em linha reta, rodopiando sobre si própria, esperançosa de vir a ser Aboubakar a chegar-lhe primeiro e não o defesa do Belenenses, que ganha a corrida até ao sítio onde essa bola longa cai na relva.

Ainda o seu voo não tinha aterrado e já um berro rouco e algo furioso se ouvia:

- “Miúdo, circula c******!”

Ser o mais garoto em campo talvez o tenha traído a pensar que perante adversários tão fechados por dentro, vendo-os, de frente, a pressionarem a saída de bola, junto à área, constatando como o FC Porto só era capaz de circular a bola pelas alas, quase nunca ligando as jogadas aos avançados, a alternativa não era forçar pela relva, mas sim bater a bola na frente, pelo ar. Sérgio Conceição gritava-lhe, irritado.

A vida ordenada do Belenenses, ao centro do campo, com os jogadores próximos e a pressionarem juntos, em bloco, dificultava a vida dos portistas. Herrera e Sérgio Oliveira mal viviam com a bola, raramente a tinham virados para a baliza contrária, tão pouco Aboubakar ou André Pereira eram úteis como paredes para tabelar. O FC Porto não jogava porque era engolido pelo jogo alheio.

O jogo querido por Silas, obreiro da equipa do Restelo que insiste em construir coisas com a bola desde trás, fiel ao conceito de ter um terceiro homem sempre solto e a receber de frente, em triângulos de passe que se formam ao longo do campo, começando logo no guarda-redes, Muriel, irmão do Alisson, que tapa a baliza da seleção brasileira a Ederson, - outro canhoto que (salvas as gigantescas diferenças) joga num estilo semelhante.

Um estilo que obrigava os dragões a esticarem a equipa, para pressionarem perto da baliza do Belenenses, tentando forçar os erros que apareciam menos vezes do que o remate de Keita, o de Freddy e outro involuntário do possante avançado, quando Casillas chutou contra ele uma bola que Felipe lhe atrasou, à queima. E Sérgio Conceição continuava aos gritos.

O FC Porto apenas dava cócegas à área contrária, incapaz de lá intrometer Brahimi, fosse pelos seus dribles, ou com passes nas costas dos defesas. Da única vez que a bola foi da esquerda à direita do ataque, Maxi cruzou-a para André Pereira, de costas para a baliza, a cabecear na marca de penálti e a fazer acertar na barra. Uma jogada casual, porque antes e depois nada mais criaram com tino.

O Belenenses do jogo em posse, com linhas de passe próximos, a ousar assumir trocas de bola na relva e no meio da pressão contrária, fazia do FC Porto uma equipa desconfortável e algo ansiosa. Mesmo após a falta extemporânea de Diogo Viana, junto à linha, que deu o livre para Alex Telles cruzar e a cabeça do mais garoto rematar (26’). Os 19 anos de Diogo Leite faziam o 1-0 e o seu treinador já não gritava.

Nem Silas, sentado no banco por imposição e para evitar castigos da Liga - por ainda não ter o nível de treinador mínimo, pelos regulamentos -, guardou as palavras para Dálcio, com quem falou muito, no relvado, antes da segunda parte arrancar. Assim que se calou e o jogo se retomou, o médio passou a bola para trás, sem olhar, na sua metade do campo. Otávio intercetou-a meio caminho e o que era para ser um atraso de Muriel e passou a ser (46’) o erro do 2-0.

Quanto maiores os riscos, maiores as consequências.

PATRICIA DE MELO MOREIRA

Mas tanto continuou a arriscar, à sua maneira, o Belenenses, que lograva avançar no campo à boleia de passes curtos até deixar alguém em posição de rematar à baliza. Como o desafortunado Dálcio, em quem o VAR, com os minutos de atraso, viu um remate que foi parado pelo braço de Diogo Leite, na área. O penálti com um par de minutos de atraso serviu para Fredy enganar Casillas (55’).

Mais ousado ficaram os azuis e retraídos, por momentos, optaram por estar os dragões. O calor e o relvado pesado do Jamor, casa emprestada para o Belenenses enquanto SAD e clube não forem um só, deram mais solavancos e contra-ataques ao jogo. Fredy já não intervinha tanto nas posses de bola, os outros médios da casa já só se viraram com a bola na frente dos homens do FC Porto, perdiam-na mais vezes e eram contra-atacados com mais frequência.

Apenas Brahimi, por uma vez, contudo, finalizou uma dessas saídas com um remate, que Muriel bloqueou ao abandonar os postes, disparado. Do outro lado, Casillas deu uso ao par de mãos, primeiro, e ao pé direito, depois, para se revezar nas paradas da tarde enquanto a equipa juntava as linhas e pressionava, cada vez menos, para lá da linha do meio campo, sobretudo nos últimos 20 minutos em que já teve um terceiro tipo a fechar espaços ao centro, em forma de Óliver Torres.

Não que a culpa esteja no espanhol, o mais talentoso, passador e pensador médio que o FC Porto tem e que mantém, e vão passando os meses, a começar os jogos no banco. Esteve, sim, no sinal que a sua entrada poderá ter dado à equipa, para se preocupar mais em segurar os jogadores perto uns dos outros e menos com a bola que os homens do Belenenses recebiam mais vezes, mesmo que fosse diante da linha dos médios dos dragões.

Não sendo pressionados tantas vezes, e tão afincadamente, eles tinham tempo para remeterem passes para Sagna e Zakarya, os alas que se colavam às linhas, ou Fredy, que já andavam mais perto dos avançados. A lentidão e a pouca intensidade dos médios portistas abria buracos, afastava-os dos defesas e deixava os atacantes do Belenenses receberem bolas para ficarem mano-a-mano com os adversários.

O que é sempre arriscado, e sempre perigoso, e foi-o quando Fredy trocou as voltas a Felipe até picar a bola para Keita empatar (83’) e dar soltura ao desespero. O FC Porto atacou o Belenenses à força e entre as tentativas forçadas, Herrera rematou uma bola ao poste, que o VAR alertou para o desvio no braço de um adversário.

Novo penálti provocado por um membro superior para Álex Telles converter, aos 90'+6, num jogo animado, intenso, bem jogado e dividido pelo que é proibido de se usar e que o prolongou para lá dos 100 minutos.

Os braços tramaram o FC Porto, antes de condenarem o Belenenses e ditarem um vencedor prático, vertical, embora pouco improvisador de soluções para os problemas em circular a bola. E um derrotado corajoso, atrevido, mas que não foi capaz de ser mais perigoso com a bola a mais que teve.

E com que provocou mais coisas negativas, do que positivas, aos dragões em quem o sofrimento foi maior que o futebol jogado.